ATIRE A PRIMEIRA FLOR
Glácia Daibert
Quando tudo parecer caminhar errado,
seja você a tentar o primeiro passo certo;
Se tudo parecer escuro, se nada puder
ser visto, acenda você a primeira luz,
traga para a treva, você primeiro, a
pequena lâmpada;
Quando todos estiverem chorando,
tente você o primeiro sorriso;
talvez não na forma de lábios
sorridentes, mas na de um coração que
compreenda, de braços que confortem;
Se a vida inteira for um imenso não,
não pare você na busca do primeiro
sim, ao qual tudo de positivo deverá
seguir-se;
Quando ninguém souber coisa alguma, e
você souber um pouquinho,
seja o primeiro a ensinar, começando
por aprender você mesmo,
corrigindo-se a si mesmo;
Quando alguém estiver angustiado à
procura, consulte bem o que se passa,
talvez seja em busca de você mesmo
que este seu irmão esteja;
Daí, portanto, o seu deve ser o
primeiro a aparecer, o primeiro a mostrar-se,
primeiro que pode ser o único e, mais
sério ainda, talvez o último;
Quando a terra estiver seca, que sua
mão seja a primeira a regá-la;
quando a flor se sufocar na urze e no
espinho,
que sua mão seja a primeira a separar
o joio, a arrancar a praga,
a afagar a pétala, a acariciar a
flor;
Se a porta estiver fechada, de você
venha a primeira chave;
Se o vento sopra frio, que o calor de
sua lareira seja a primeira proteção
e primeiro abrigo.
Se o pão for apenas massa e não
estiver cozido,
seja você o primeiro forno para
transformá-lo em alimento.
Não atire a primeira pedra em quem
erra.
De acusadores o mundo está cheio;
nem, por outro lado, aplauda o erro;
dentro em pouco, a ovação será
ensurdecedora;
Ofereça sua mão primeiro para
levantar quem caiu;
sua atenção primeiro para aquele que
foi esquecido;
Seja você o primeiro para aquele que não
tem ninguém;
Quando tudo for espinho, atire a
primeira flor;
seja o primeiro a mostrar que há
caminho de volta,
compreendendo que o perdão regenera,
que a compreensão edifica, que o
auxílio possibilita,
que o entendimento reconstrói.
Atire você, quando tudo for pedra,
a primeira e decisiva flor.